CCJ vota emenda que ‘esvazia’ os poderes do Executivo
Decisão final sobre terras de índios seria dos senadores
Estado passaria a ‘indenizar’ os ‘não índios’ desalojados

A CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado incluiu na pauta de votações desta quarta (25) uma emenda constitucional polêmica.
Modifica profundamente o rito dos processos de demarcações de terras indígenas no Brasil. O relator da proposta é o senador Valter Pereira (PMDB-MS).
Ele submeterá à apreciação dos colegas um voto que, se aprovado, injetará no texto da Constituição duas novidades:

1. Transfere-se a palavra final sobre a demarcação de reservas indígenas do âmbito do Poder Executivo para o Legislativo.
A análise dos processos continuaria sob a responsabilidade do governo. Mas a decisão do presidente da República só vigoraria depois de referendada pelo Senado.

2. Obriga-se o Estado a pagar indenização pelas terras de não índios obrigados a deixar as áreas reconhecidas como reservas indígenas.
A reparação terá de cobrir, além das benfeitorias, o valor da “terra nua”. Algo que a Constituição de 88 vedou.
Reza o parágrafo 6º do artigo 231 da Constituição que os “títulos de domínio” de terras assentadas em reservas indígenas serão declarados nulos.
Diz ainda o texto constitucional que a declaração de nulidade não gera “direito a indenização ou a ações [judiciais] contra a União”.
A Constituição abre brecha apenas para a indenização das “benfeitorias derivadas da ocupação de boa fé”. Nada de pagamento de terras.

A emenda relatada por Valter Pereira (na foto) vagueia pelos escaninhos do Senado há dez anos. Foi apresentada, em 1999. É subscrita por 29 senadores.
Chama-se Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) o autor. É um antigo defensor da causa dos arrozeiros da reserva Raposa Serra do Sol, que acaba de ser ratificada pelo STF.
A decisão do Supremo desalojou os arrozeiros defendidos por Mozarildo. Sem direito a indenização. E a emenda, velha de uma década, despertou súbito interesse.
A proposta escalou a pauta desta quarta (24) da comissão de Justiça. É o 17º item de uma lista de 28 projetos selecionados para votação.
Em seu parecer, Valter Pereira anota: “Acredito que o Senado Federal é a melhor instância para dar a última palavra” sobre as reservas indígenas. Por quê?
O Senado, o senador Pereira escreve, é “a Casa em que a Federação está representada de forma isonômica...”
“...Portanto, em igualdade de forças para defender os interesses maiores do Estado Brasileiro”.
O senador realça no texto de seu voto que, “vários Estados brasileiros sofreram e têm sofrido o comprometimento de elevadas proporções de seus territórios...”
As demarcações de reservas indígenas tem sido feitas, segundo ele, em “áreas realmente vastas”. Valter Pereira escora-se em dois números.
Um deles, atribuído à Funai, informa que, “em termos absolutos”, as terras indígenas somavam 105,6 milhões de hectares em todo país no ano de 2006.
O outro dado foi fornecido pelo Serviço Florestal Brasileiro. Indica que, em 2007, as reservas indígenas brasileiras somavam 109,1 milhões de hectares.
A emenda apresentada por Mozarildo não tratava de indenização de terras de não índios. Essa idéia Valter Pereira extraiu de uma outra proposta.
Trata-se de emenda apresentada em 2004 pelo ex-senador Juvêncio da Fonseca (PSDB-MS). Propunha que o Estado desapropriasse as terras dos não índios.
O problema é que, de acordo com a Constituição, as terras indígenas integram o patrimônio da União. E o Estado não poderia desapropriar aquilo que já é seu.
Por isso, Valter Pereira rejeitou a emenda de Juvêncio. Aproveitou, contudo, a “idéia central” da proposta do colega, instituindo a indenização da “terra nua”.
Na opinião de Valter Pereira, “não é correto que o Estado solucione a questão indígena à custa daqueles que, em 05 de outubro de 1988...”
“...Ostentavam o direito de propriedade com amparo em título emitido pelo próprio Poder Público, por meio de seus órgãos delegados”.
A data de 5 de outubro de 88 não foi escolhida ao acaso. Foi nesse dia que a Constituição votada pelo Congresso constituinte foi promulgada.
blog do josias
Portanto, anota Valter Pereira, a “retroatividade” da indenização aos não índios “só vai” até esse dia, “a data do surgimento do direito”.
Se for aprovado pela CCJ, o parecer que altera o processo de demarcação de terras indígenas seguirá para o plenário do Senado. E, dali, para a Câmara.
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