Governador cancela contratos com organizações sociais

Unidades de saúde devem ser geridas por programa estadual, de responsabilidade da Secretaria de Estado da Saúde. Sobre acusações de delatores da 'Calvário', João Azevêdo disse que não conhece o processo e não vai se pronunciar.

O governador da Paraíba João Azevêdo (sem partido) disse que todos os contratos com as organizações sociais não serão mais renovados, após o fim de cada um. A declaração foi dada durante uma entrevista coletiva concedida na manhã desta segunda-feira (23), no Palácio da Redenção, em João Pessoa.

O posicionamento do governador acontece dias após a Operação Juízo-Final, que investiga organização criminosa suspeita de desvio de R$134,2 milhões de serviços de saúde e educação, por meio de organizações sociais, em que João Azevêdo (sem partido) e o ex-governador Ricardo Coutinho (PSB) foram alvos.

De acordo com João Azevêdo, os contratos devem ser encerrados entre o mês de dezembro e de fevereiro, prazo final do último contrato com organizações sociais. Ainda nesta segunda-feira, todas as organizações sociais devem ser notificadas sobre o fim dos contratos. Atualmente, as unidades de saúde estão incluídas em um plano emergencial, desde julho de 2019, com a gestão de outras organizações sociais.

O objetivo atual do governador da Paraíba é que a gestão das unidades de saúde fique sob total responsabilidade da Secretaria de Estado da Saúde. A gestão deve ser feita com a Fundação paraibana de Gestão em Saúde, a partir do programa PB Saúde. O projeto de lei complementar foi enviado à Assembleia Legislativa da Paraíba e tem personalidade jurídica e função de integrar a administração pública indireta do governo do Estado.

A proposta prevê a implantação gradativa do programa em substituição às organizações sociais envolvidas em um esquema de corrupção que desviava dinheiro das unidades de saúde. A medida irá permitir que se torne mais ágil a compra de material permanente, equipamentos e a realização de concurso ou processos seletivos simplificados.

Governador da PB diz que contratos com organizações sociais não serão renovados

A Operação Calvário foi desencadeada em dezembro de 2018 com o objetivo de desarticular uma organização criminosa infiltrada na organização social Cruz Vermelha Brasileira, filial do Rio Grande do Sul, além de outros órgãos governamentais. A operação teve sete fases, resultando na prisão de servidores e ex-servidores de alto escalão na estruturado governo da Paraíba, incluindo o ex-governador Ricardo Coutinho (PSB)solto após decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

A ex-secretária de administração do Estado da Paraíba, Livânia Farias, foi presa suspeita de receber propina paga pela Cruz Vermelha, que administrava o Hospital de Emergência e Trauma de João Pessoa. Ela teria recebido, por mês, propina na ordem de R$ 80 mil paga pela Cruz Vermelha. Depois, o esquema também se estendeu para a área da educação.

A investigação identificou que a organização criminosa teve acesso a mais de R$ 1,1 bilhão em recursos públicos, para a gestão de unidades de saúde em várias unidades da federação, no período entre julho de 2011 até dezembro de 2018.

Sétima fase identificou desvio para campanhas eleitorais

Além disso, deflagrada a sétima fase da operação, nesta terça-feira (17), a investigação identificou fraudes em procedimentos licitatórios e em concurso público, além de corrupção e financiamento de campanhas de agentes políticos e superfaturamento em equipamentos, serviços e medicamentos.

Segundo a "Operação Calvário - Juízo Final", do valor total desviado, mais de R$ 120 milhões foram destinados a agentes políticos e às campanhas eleitorais de 2010, 2014 e 2018.

Sobre a campanha de 2018, cujo um dos candidato ao governo da Paraíba era João Azevêdo, na época filiado ao PSB, hoje sem partido, o governador declarou que a campanha "foi feita com os fundos do partido e a prestação de contas foi aprovada". Ele disse ainda que essa foi a determinação dele para a campanha. "Se durante o processo, alguém se aproveitou do momento político para agir de forma errada, essas pessoas vão responder por isso", enfatizou.

Ex-governador Ricardo Coutinho (PSB) e governador João Azevêdo (sem partido) são alvos da Operação Calvário — Foto: Junior Fernandes/Secom-PB - André Lúcio/Secom-PB
Ex-governador Ricardo Coutinho (PSB) e governador João Azevêdo (sem partido) são alvos da Operação Calvário — Foto: Junior Fernandes/Secom-PB - André Lúcio/Secom-PB

Em vídeos exibidos neste domingo (22) pelo Fantástico, o agora delator Daniel Gomes afirma aos investigadores que os repasses foram negociados com Ricardo Coutinho desde 2010 e que o esquema ilegal continuou com o atual governador João Azevêdo (sem partido). "O Ricardo era o líder, indiscutivelmente", afirma.

Durante a coletiva nesta segunda-feira (23), João Azevêdo disse que não teve acesso ao processo e só depois de ter informações sobre a investigação é que vai dar alguma explicação sobre o caso. "Não tenho preocupação em renunciar, não farei isso. Eu nunca me reuni para pedir recursos para campanha", declarou.

Em trechos da delação de Livânia Farias, ela afirma que entregou R$ 1 milhão ao ex-governador, e também relata uma entrega feita no ano passado, em uma caixa de vinho, por meio do assessor Leandro Nunes, que teria ido buscar a propina no Rio de Janeiro. Ele também foi preso, em fevereiro, e afirmou que o dinheiro era para ajudar na campanha de João Azevêdo, também ex-secretário do estado, eleito governador em 2018. Conforme a investigação, o dinheiro era para pagar material de campanha, como adesivos e bandeirinhas.

Leandro Nunes foi flagrado recebendo um repasse de dinheiro dentro de uma caixa de vinho — Foto: Reprodução/TV Globo
Leandro Nunes foi flagrado recebendo um repasse de dinheiro dentro de uma caixa de vinho — Foto: Reprodução/TV Globo

O delator Daniel Gomes, preso em dezembro de 2018, tinha contratos com o Governo da Paraíba por meio de organizações sociais. Ele responde em liberdade, após entregar aos investigadores gravações de conversas com o ex-governador Ricardo Coutinho e com assessores dele sobre acordos fraudulentos e entregas de propinas. Segundo Daniel, o valor médio das propinas era de 10% sobre os contratos.

  • Daniel Gomes: “Eu consigo trabalhar seguramente com 10%, esse número é bem seguro”.
  • Ricardo Coutinho: “Mas isso no início ou no fim?”
  • Daniel Gomes: “Posso fazer quando o senhor fizer a primeira entrada aqui, eu já consigo viabilizar parte, posso adiantar”.
  • Em uma conversa gravada em novembro de 2017, o delator afirma que explica a Ricardo Coutinho sobre dois repasses de propina de R$ 1,5 milhão, cada.
  • Daniel Gomes: “Então governador, hoje eu tô com 1.5 disponível. O outro 1.5 eu acho que no início de janeiro”.
  • Ricardo Coutinho: “Livânia tá sabendo?”
  • Daniel Gomes: “Não”.

Segundo a investigação, Livânia Farias, ex-procuradora geral do estado e ex-secretária de administração, presa em março deste ano e que também fez delação premiada sobre o suposto esquema de corrupção, houve entregas de dinheiro a Ricardo Coutinho por meio de caixas. Conforme o MPPB, Livânia Farias teria recebido, por mês, propina na ordem de R$ 80 mil.

“Entreguei ao governador Ricardo Coutinho. Era um valor de R$ 800 mil. Nas mãos dele”, diz Livânia Farias na delação, sobre repasse que teria sido feito em 2018.

Em outros trechos, Livânia afirma que entregou R$ 1 milhão ao ex-governador, e também relata uma entrega feita no ano passado, em uma caixa de vinho, por meio do assessor Leandro Nunes, que teria ido buscar a propina no Rio de Janeiro. Ele também foi preso, em fevereiro, e afirmou que o dinheiro era para ajudar na campanha de João Azevêdo, também ex-secretário do estado, eleito governador em 2018. Conforme a investigação, o dinheiro era para pagar material de campanha, como adesivos e bandeirinhas.

O esquema, originalmente feito por meio de fraudes na saúde, foi estendido para a área da educação. O superintendente regional da Controladoria Geral da União (CGU), Severino Queiroz, afirmou que havia empresas contratadas irregularmente por R$ 90 milhões para aquisição de livros e material gráfico.

Segundo a investigação, houve uma compra de 300 mil agendas sem licitação, cada uma a R$ 20. Em outros estados, material parecido foi comprado por R$ 3 e também por 60 centavos. O superfaturamento foi de até 450%.

Governador e ex-governador da Paraíba são alvos da 'Operação Calvário' — Foto: Arte/G1
Governador e ex-governador da Paraíba são alvos da 'Operação Calvário' — Foto: Arte/G

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